Se há duas coisas que no Ceará não me permite ficar surpreso de modo nenhum são, primeiro, a completa falta de comunicação adequada sobre a situação do clube nos últimos oito anos e, segundo, a total desesperança esperançada da torcida para que o time em campo funcione. Ambos são reflexos de um modo de gerir a instituição em que a forma, a estrutura de comando, se faz mais importante que o conteúdo, a relação com as pessoas que fazem o clube.
Ora, a revelação da dívida do Ceará, tanto com a Receita Federal quanto com atletas, pode ter chocado a torcida em geral, devido ao fato de que a propaganda do clube nos últimos anos era a de que este está estruturado e se caísse, o faria de pé, estando inclusive apto a retornar à Série A no seguinte ano.
Toda esta propaganda se mostrou não verdadeira e revela uma lógica que tem origem ainda na gestão de Robinson de Castro que, em seus últimos momentos como presidente, negociou os direitos federativos de vários jogadores (tais como Lima, Marcos Victor, Fernando Sobral etc.) sob o pretexto de que precisava pagar empréstimos do clube feitos junto a instituições financeiras, cujo o fiador era ele mesmo.
Obviamente, que é completamente legítimo desconfiar das próximas gestões do clube e não contrair dívidas por tabela por conta da falta de competência de terceiros. Entretanto, este evento talvez tenha sido o desencadeador da quebra do planejamento do clube (além da queda para Série B do Campeonato Brasileiro, obviamente).
Depois desse evento de despedida do ex-mandatário do clube, transpareceu para a torcida que tínhamos ainda alguns trunfos, algum dinheiro em caixa, receitas vindas da nova liga de futebol do Brasil, etc. Entretanto, o choque de realidade que tivemos nesta semana mostra que esse buraco é mais profundo, que há uma realidade caótica em que o modelo de gestão do atual presidente, João Paulo Silva, precisa escolher entre gastar/investir em um time competitivo e rolar a dívida o máximo possível ou pagar a dívida e ter um time mais barato (o que possivelmente é sinônimo de time mais fraco).
Parece que a primeira opção foi a escolhida, contudo o conteúdo da escolha nos aponta para acertos na montagem do elenco, em que ao mesmo tempo que temos várias opções nas diversas posições também temos um time com jogadores cascudos e não tão caros. Isto quer dizer que a gestão do departamento de futebol, por meio de Lucas Drubscky, está acertando no campo, ou seja, em meio ao caos de gestão financeira do time há uma ordem mínima capaz de reacender a chama da desesperança esperançada.
Ora, como já venho alertando em minhas últimas colunas, nosso primeiro semestre não vai ser fácil e provavelmente vamos sofrer reveses que nos farão duvidar de tudo que até aqui foi feito. Contudo, penso que, do ponto de vista do campo, o segundo semestre vai ser glorioso e se no primeiro semestre pudermos competir, já estará de bom tamanho devido à realidade que hoje nos encara, ou seja, uma equipe completamente nova e desentrosada.
CEARÁ PRECISA DA MUDANÇA DE METODOLOGIA
Mas, como falei no início, para entrosar uma equipe não basta um treinador de futebol e sua metodologia de treinos dentro do campo, faz-se necessário um novo tipo de organização social dentro do clube. Trabalhar em uma equipe de futebol para a qual se torce não é o mesmo que trabalhar em uma empresa qualquer, pois o fator paixão e envolvimento já está pressuposto.
Se nesse mesmo ambiente as pessoas não se sentirem envolvidas com a paixão e forem tratadas como meros “colaboradores” (eufemismo cínico para trabalhador), se esses funcionários não estiverem em sintonia com os jogadores, se o clube se mostrar um mero agregado de departamentos diferentes competindo uns contra os outros, em vez de cooperarem, teremos aí a receita do fracasso, tal como ocorreu no ano passado.
Portanto, é necessário ordenar o caos, uma vez que resolver as demandas para debelar a situação caótica não é possível no momento. É necessário cooperação total, transparência completa da diretoria de modo que, antes que a oposição revele as “entranhas” do Ceará, a própria diretoria deve revelar para que, com isso, se possa unir a todos em torno da esperança de que, tal como navegar em um mar bravio, o momento caótico completo passará, mas é necessário saber como sobreviver a ele. Espero que sobrevivamos!
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